ESPETÁCULO CORPOS

VAGAR ITINERANTE E EXPERIÊNCIA EM CORPOS ACUMULADOS

CONVITE - Experimento I

Apressentação do experimento I, realizada simultaneamente na Usina de Compostagem de Lixo em São Mateus e no Hostital Psiquiátrico Pinel de nov/2008 à jan/2009



Desde o final de 2007, discutíamos a estrutura espacial para Corpos Acumulados. Que espacialidade revelaria a luta de classe no capitalismo tardio? Testávamos cenas, que parte do publico não podia vê-la, outras, que o publico só escutava a cena. Experimentamos no ensaio aberto realizado em janeiro de 2008, a divisão do publico em duas trajetórias: consumidores e trabalhadores leprosos.
Os consumidores representavam o ponto de vista da classe dominante, os que detem o poder, os empresário, as grandes corporações, aqueles que já não sabemos identificar (Quem é o inimigo?). Já os trabalhadores leprosos, retratam a classe dominada, os explorados. A radicalização desta idéia se deu na decisão de realizar a peça em dois espaços. Começamos a procurar um espaço na zona oeste da cidade, pois a idéia era unir dois extremos da cidade de São Paulo (Amanda - Integrante do grupo)

Experimento I - USINA

Apresentar um espetáculo na Usina tem, como objetivo estético, a intenção de estabelecer com o espaço não convencional um diálogo, já que os temas a serem tratados na pesquisa e no espetáculo (a destruição e construção contínuas como paradigmas da ocupação do espaço capitalista) tem estreita relação com um lugar habitado por imensas máquinas abandonadas, incapazes que são de digerir a quantidade crescente de lixo produzido pela cidade



A Usina é o espaço de grande interferência no processo. O contato com o lixo da Usina, o espaço gigantesco e vazio modifica nossos corpos, mesmos sem estarmos lá. O espaço precário, de difícil acesso, onde há guardas que realizam a segurança do nada, e representa para Corpos Acumulados o ponto de vista dos dominantes sob a perspectiva do arcaico, nos revela ao pensar em cada cena naquele espaço, possibilidades múltiplas para o espetáculo. E por mais que estejamos fora dela focamos a criação de cenas, mesmo no Pinel, em espaços que de alguma maneira dialoguem com ela. O elenco mesmo ausente dela continua dividido e focado em contar o processo sob os diferentes pontos de vistas (Sansorai - Integrante do grupo)



Para tratar do sujeito contemporâneo pesquisamos um registro de interpretação que possa dar conta das diversas vozes que atravessam e compoem o sujeito: um registro que chamamos de interpretação polifônica, que estamos construindo ao longo desses quase três anos de pesquisa. Os personagens que estamos construindo são compostos por vários agenciamentos, várias vozes que atravessam suas trajetórias e para isso buscamos uma interpretaçào polfônica, um corpo polifônico (Luzimara - Integrante do grupo)



É um desafio muito grande, temos uma Usina de Compostagem de lixo e um hospital Psiquiátrico, dois lugares extremamente opostos e de diferente relação.Temos que manter esses dois lugares totalmente relacionados pois eles são nossas bases e estrutura. Sem essas relações é muito difícil esclarecer nosso ponto de vista referência de nossa linguagem artística, sendo dois pontos de vista diferentes e a mesma peça (Carmem - Integrante do grupo)

Tudo o que o ser humano usa e não serve mais é jogado fora, transformado em lixo, algo que incomoda que queremos nos livrar, que não serve mais para sociedade. Com o capitalismo as coisas ficaram cada vez mais descartáveis até mesmo o ser humano (Leila - Integrante do grupo)



Ao dividirmos o espaço tínhamos a grande pretensão de realizar conexão via internet entre os dois espaços, idealizamos essa idéia e no decorrer acabamos barrados pela realidade, trabalhamos em duas periferias nos extremos da cidade, a conexão possível não oferece nenhum tipo de instabilidade, nos deparamos com diversas esferas da burocracia e por fim a única forma de estabelecer uma conexão seria impossível paga-la. A tentativa do ensaio aberto em dezembro, foi a realização de uma cena simultânea via telefone, onde o mesmo dialogo era tratado sob pontos de vista diferentes. Me questiono como é possível em uma mesma cidade em espaços tão próximos, centro - zona leste/centro - zona oeste, haver diferenças tão gritantes sobre como cada um desses espaços vivem, sobre qual a maneira como vivem os indivíduos de cada espaço. A forma como lidam e utilizam tecnologia é totalmente diferente, isso é claro simplesmente com a visita a qualquer um dos espaços, Pinel ou Usina, se utilizando do transporte público (Sansorai - Integrante do grupo)



Defendo essa idéia dos dois espaços.O publico vê a mesma peça sob dois pontos de vista diferentes(pois o espaço interfere na peça,o espaço não é indiferente).Com isso teremos diversos pontos de vista:de quem viu na Usina,de quem viu só no Pinel,de quem viu primeiro na Usina(e depois no Pinel),de quem viu primeiro no Pinel(e depois na Usina)(Anderson - Integrante do grupo)



Usina: temos a relação da dominação daquilo que é o atraso,o precário
Pinel:temos a relação dos dominados o moderno,o progresso



Realizamos uma ampla temporada de ensaios abertos na Usina. No, entanto uma decisão da Secretária Municipal de Serviços nos proibindo a continuar a ocupação cultural na Usina, alegando falta de segurança. Desde então, todo o grupo se mobilizou para a recuperação da Usina. Tivemos várias reuniões com os responsáveis pela autorização do nosso retorno a Usina. No dia 03/06/09, nos reunimos com o responsável pela garantia da segurança da Limpurb (administradora do espaço). Fizemos o percurso da peça com ele, que se certificou que não há perigo em continuarmos na Usina. Mesmo sem poder utilizar a Usina, continuamos a investigação do espetáculo no espaço do Pinel

Com o afastamento temporário, os ensaios antes programados para ocorrerem na Usina continuam acontecendo no Pinel em locais que sejam semelhantes aos originais, visando minimizar ao máximo possível os prejuízos da ausência



EXPERIMENTO II - Ensaio em Devir

A forma apresentada ao público em Corpos Acumuladas procurou ser sempre ENSAIO EM DEVIR. Isto porque o grupo procurou romper com a forma mercadoria, não só nas apresentações gratuitas, mas também com relação ao conceito de produto. Assim, as apresentações constituíram-se sempre através de um formato aberto, que buscava na relação com o público estabelecer um grande processo coletivo de criação



O ensaio em devir Corpos Acumulados procura estabelecer com seu público uma experiência crítica. Além de uma racionalidade cínica, que se estabelece na relação com o público, que não sabe nunca quais as regras do jogo e as leis a que está submetido, estamos lidando com uma tentativa de experiência coletiva.
As relações entre atuantes e platéia, entre a gênese poética e sua performance, entre o texto e sua presentação estão alteradas por esses novos sujeitos da cena: corpos que ganham outro alinhamento, consciências que criam outro tempo cênico, um tempo da espera, do imprevisto, do espontâneo, construções cênicas que propõem a suspensão e a epifania, mecanismos esses que afirmam uma cena – capaz de dar conta das novas espacialidades e temporalidades do capitalismo tardio - sustentada no acontecimento e não na representação, na emancipação e não no ensino



´As perguntas norteadoras nos seguiam: “Que tipo de teatro queremos fazer? Qual forma é capaz de dar conta dos temas tão complexos que há 3 anos estamos pesquisando: As relações contemporâneas de trabalho, o homem como centro dessas relações, como um indivíduo esburacado, repleto de vozes que o perpassa, como um consumidor, controlado pela forma mercadoria, cujo corpo é depósito de geração de valor
Partimos do herói trágico, indivíduo dotado de uma conduta e de uma forma de agir coerente, cuja trajetória é bem delineada, para nos tempos esses negá-lo e deformá-lo. É possível um herói hoje em dia, nos perguntamos?
O trabalhador do teatro épico também há muito já se calou. Nos interessa buscar o sujeito de hoje, bombardeado pela quantidade de informações e rapidez com que as coisas passam, que faz mil coisas ao mesmo tempo e que por isso muito pouco experimenta de fato. O sujeito de milhares de vozes em um só corpo´ (Carmem - atriz do grupo)



Relato do ator em cena - Na 1ª cena da peça, eu filmo uma cena num espaço (”parquinho”) que é transmitido para o público que está no espaço da “casinha”. O interessante dessa cena é a fronteira (limite) entre estar e não estar em cena. Visualmente eu estou fora de cena, mas o meu olhar não. O meu olhar é mostrado pelo jeito que eu filmo a cena. Se por acaso eu filmo o que não deveria filmar a gravação fica comprometida. É um modo criativo e artístico sobre a cena, não apenas o lado técnico da filmagem.
Uma situação interessante que ocorreu: houve um aquecimento nessa cena mediada pela filmagem.O pessoal do espaço da “casinha” via as instruções dadas pelo diretor no espaço do “parquinho”.Aonde os 2 elencos aqueceram mediados pela filmagem.
Durante a temporada do Experimento 2, houve uma mudança na filmagem para haver um diálogo maior (uma interferência maior) entre os espaços, pois parte do público tinha a sensação de que o vídeo era gravado e não era ao vivo



´Para compreender e transparecer a compreensão é preciso mais. Mais renúncia ao corpo cotidiano que ao realizar simples mimese dos movimentos do dia-a-dia pouco revela a respeito da realidade em que vivemos. Mais abandono ao corpo teatral convencional e viciado pelos automatismos que desenvolvemos ao entrar em cena que também pouco dizem sobre um mundo que a um só tempo personaliza e padroniza as relações e reações. Como sugere o titulo do projeto é necessário um corpo acumulado que esteja pronto a compreender novas formas, reconhecer novas extensões do corpo adormecido´ (Cintia - atriz do grupo)



´Todas as situações revelam o antagonismo, as contradições e o conflito em nosso dia a dia. Seguido das leis que mantém a ordem, a ética e a moral que estabelece culturalmente a nossa educação social, e quebrar as regras ideológicas estabelecidas, é ir de encontro com o desconhecido. “A Polifonia” é, um desafio inovador que ativa a adrenalina a que percorre o corpo, dentro do universo teórico tão próximo em sua pratica tão distante, tarefa à principio impossível de realizar. Nos jogamos no abismo em busca de descobrir horizontes que através de outras linguagens, surgem varias criações de novos registros e partituras corporais. Essas multiplicidades de sons e movimentos que dialogam ou não entre si, são reveladas através dos registros de comportamentos que transparece na interpretação dos atores, onde cada um traz suas experiências de vida e, junto com as referências pesquisadas isso provoca grandes conflitos e traz uma explosão de polifonias´ (Elezeu – ator do grupo)



Este video, da apresentação do experimento II, foi sendo criado no decorrer das apresentações do espetáculo, em 2009, tendo a cada nova fase, um novo formato, pois, assim se tornou um fluxo permanente a cada apresentação, sendo construídos vídeos a partir das imagens do espetáculo que estava sendo apresentado naquele dia, sendo entregue uma mídia em dvd, ainda em cena para publico, com imagens do publico



A ação do vídeo se desenvolve durante a apresentação do espetáculo, tendo a câmera como um objeto de ação dentro das cenas. Em uma delas, o ator ao encontrar com o publico mira-os com uma câmera, como com uma arma, sendo objeto cênico ao mesmo tempo em que registra imagens que constarão no DVD a ser distribuído posteriormente. Em outra cena, o público é fotografado dentro da cena, e ao mesmo instante filmado. Após este processo as imagens capturadas tanto pela câmera fotográfica, quanto pela filmadora, junto ao computador, entram em ação



É o momento de transferir as imagens para o computador e editá-las, para isso foi preciso definir os fragmentos exatos das imagens captadas durante o espetáculo, para então calcular o tempo de processamento em que a montagem seria realizada, tanto da edição, quanto do processo de transcodificação de arquivos das imagens. As imagens filmadas quando fotografadas serão posteriormente usadas nas cenas seguintes, introduzindo as cenas primeiras nas posteriores da mesma forma como se consegue transformar o público em objeto de cena, resignificando-os por meio de tecnologia.
Durante a montagem do vídeo, calcula-se o tempo de edição das fotos e filmagens junto à ‘linha de montagem’ do material pré-editado, em seguida, o tempo para ‘renderizar’ o vídeo (para que o material audiovisual esteja finalizado antes da cena em que será utilizado). Para finalizar, o tempo do processo gasto para a transcodificação do arquivo ‘AVI’, para DVD. Terminado a montagem em DVD, utilizamos uma duplicadora na qual imprime 11 DVDs simultaneamente, o que leva em torno de 5 minutos. Todo este processo é realizado no decorrer do espetáculo
Os DVDs entregue para o público, o espectador, ao assistir ao vídeo, reconstrói mentalmente a mensagem fragmentada da montagem, em paralelo as cenas da apresentação, em alguns casos, um outro texto do roteiro é modificado, o que permite ao espectador criar outros significados. A cada apresentação do espetáculo, o vídeo é modificado, tanto com imagens e fotografias do publico, como por imagens e apresentações de ensaios anteriores



Não se trata se sugerir para o público-espectador, que todo o vídeo foi a apresentação do mesmo dia do espetáculo, mas, explorar novas formas percepções associadas à memória dos ensaios e das demais apresentações, leituras e conexões entre o público participante, o teatro e o vídeo, onde o público ao assistir o vídeo do espetáculo e se ver enquanto sujeito da ação, interação, possa refletir, e se aprofundar nas ligações sutis e muitas vezes inéditas do material trabalhado. Nossas fontes criativas, autônomas, aptas a criar novas sensações, modos de agir, pensar, experimentar o próprio corpo, intensificando e explorando novas possibilidades

EXPERIÊNCIA TRÊS E QUATRO

Ensaio aberto realizado dia 20 de março de 2010

















APRESENTAÇÃO

CORTES E RECORTES ELETRÔNICOS

Mesmo não apresentando uma concepção narrativa mais definida, que se apoiasse nas
possibilidades discursivas da imagem e do som, tais obras já evidenciavam uma intertextualidade entre a ação performática do artista e esse aparato eletrônico.

Utilizando câmeras de circuito internos e monitores, videoinstalações e videoperformance.

Seguindo as propostas de seus colegas brasileiros, confirmou a natureza hibrida e expandida do meio, apresentando proposições estéticas nas quais o vídeo não era entendido exclusivamente por sua propriedade de imagens em movimento, mas por suas relações sensoriais com o ambiente, o expectador e os seus modos de produção e exibição.

Forjar um modo peculiar e original de fazer vídeo e provocar uma atualização estética e formal do que se produzia até em tão.

Documentário, videoclipe e videoexperimental.

Uma miscigenação das práticas criativas, nas quais os artistas passam a transitar por meios e suportes menos ortodoxos, como a computer art, a fotografia digital, as instalações interativas e o próprio vídeo, que se transforma numa ferramenta cada vez mais acessível em função de seu extraordinário desenvolvimento tecnológico.

Multimídia e internet.

Linguagens híbridas, códigos polifônicos e meios diversos estão sendo amplamente explorados e são elementos fundantes dessa produção.

Propor uma criação coletiva em seus trabalhos, utilizar as possibilidades dos recursos do vídeo em tempo real para criar espetáculo multimídia desconcertantes.
Roberto Moreira S. Cruz

INTRODUÇÃO

AS LINHAS DE FORÇA DO VÍDEO BRASILEIRO – Arlindo Machado

(Sobre o ínicio do vídeo) Esse equipamento havia sido colocado no mercado pela indústria eletrônica jáponesa para uso privado nas empresas, com vistas ao treinamento de funcionários, mas nada pode impedir que, em determinada circunstâncias as expectativas industriais fossem superadas.
A simples disponibilidade desse equipamento abriu espaço para o surgimento daquilo que René Berger chamou de micro televisão, uma televisão radical produzida e difundida em circuito fechado, independente dos modelos econômicos e cultural da televisão broadcasting convencional.
Como se sabe, a partir de meados da década de 1960, muitos artistas tentaram romper com os esquemas estéticos e mercadológicos da pintura de cavalete, buscando materiais mais dinâmicos para dar formas às idéias plásticas. Entre os que se aventuraram para fora dos espaços tradicionais da arte, houve aqueles que foram buscar materias para experiências estéticas inovadoras nas tecnologias geradoras de imagens industriais, como é o caso da fotografia, do cinema e sobretudo do vídeo.
Hélio Oiticica – Quase cinema, para designar um campo de experiências trangresivas dentro do universo das mídias ou das imagens e sons produzidos técnicamente.
De qualquer forma, o video nasceu integrado ao projeto de expansão das artes plásticas, como um meio entre outros, mas no processo criativo do artista ele nunca chegou a ser encarado com exclusividade, às vezes, era mesmo díficil compreender os trabalhos de vídeo art fora do conjunto da obra do autor (processo).

A técnica de escritura múltipla em que texto, vozes, ruídos e imagens simultâneas se combinam e se entrechocam para compor um tecido de rara complexidade, constitui a própria evidência estrutural daquilo que modernamente nos convencionamos chamar de uma estética da saturação, do excesso ( a máxima concentração de informação num mínimo de espaço-tempo) e também da instabilidade ( ausência quase absoluta de qualquer integridade estrutural ou de qualquer sistematização temática ou estilística).

O trabalho criativo é sui generis e não tem similares em nossa videografia. Antes de mais nada trata-se de uma pesquisa de transferência do olhar na tentativa de experimentar um outro ponto de vista sobre o mundo, um ponto de vista “interno” a certos grupos humanos “atipicos”, como o das crianças autistas.

Busca não exatamente construir um discurso sociológico ou antropológico sobre o outro, mas criar alguns dispositivos semióticos que nos permitam, sob certas condições, “assumir” o ponto de vista ( e o ponto de audição) do focalizado, situando-nos em “seu”mundo.

Busca de novos formatos videograficos ou de novas extruturas narrativas, menos comprometidas com as práticas já cristalizada no cinema ou na televisão.

O corpo e a câmera

O dispositivo mais básico do vídeo: o confronto da câmera com o corpo do artista.
Colocar o corpo do artista entre duas máquinas ( a câmera e o monitor) de modo a produzir uma imagem instantânea, como a de um narcisio mirando-se no espelho.
Editava se diretamente na câmera durante a gravação, ou ainda concebia-se o trabalho num único plano contínuo, tomado em tempo real para que não houvesse necessidade de edição.
Situação mínima de uma performance diante da câmera, tomada em tempo real num único plano por uma câmera fixa.

Ex-figurativo, ex-narrativo, experimental

A imagem eletrônica se caracteriza, antes de mais nada pela sua extraordinaria capacidade de metamorfose. Pode-se nela intervir infinitamente, subverter seus valores cromáticos, inverter a relação figura e fundo, tornar transparentes os seres representados. Ela é , antes de tudo, imagem, irridescente, imagem-luz, em que a informação plástica coincide com a fonte luminosa que a torna vísivel. Não por acaso, a arte do vídeo que se constitui tão logo os recursos técnicos se tornam disponiveis, se definirá rapidamente como uma retórica da metamorfose: em vez da exploração da imagem consistente, estável e naturalista da figura clássica, ela se definirá resolutamente na direção da distorção, da desintegração das formas, da instabilidade dos enunciados e da abstração como recurso formal .

A vídeoart será, no universo das imagens tecnicas a forma de expressão artísticas que assumirá com maior radicalidade que qualquer outra, a tarefa de produzir uma iconografia resolutamente contemporânea, de modo a reconciliar as imagens técnicas com a produção estética do nosso tempo.

A obra é constituída predominantemente de ruídos, interferência, “defeitos”,disturbios do aparato técnico e às vezes, roça mesmo os limites da visualização.

Projetar imagens de vídeo sobre paredes texturadas e rugosas, ou ainda sobre chão regular, de modo a perturbar a inteligibilidade das imagens ou corromper a sua coerência figurativa.

Uma interferência deliberada sobre o dispositivo técnico( wipes sucessivas e muito rápidas, simulando perda constante do sincronismo vertical dos frames) faz com que as imagens oscilem o tempo todo diante do olhar do espectador, tornando díficil – às vezes impossível a visualização.

Os elementos constitutivos do quadro migram de diferentes contestos espaciais e temporais e se encaixam, se encavalam, se sobrepõem uns sobre os outros em configurações híbridas. E uma vez que agora os novos processos imagetícos despejam seu fluxo de imagens e sons de forma simultânea, isso exige, da parte do receptor, reflexos rápidos para captar todas (ou parte de) as conexões formuladas, numa velocidade que pode mesmo parecer estonteante a um expectador mais conservador, não familiarizado com as formas expressivas da contemporâneidade.

Os recursos de edição e processamento digital permitem jogar para dentro do quadro do vídeo uma quantidade quase infinita de imagens ( mais exatamente fragmentos de imagens) fazê-las combinar-se em arranjos inesperados, para logo em seguida repensar e questionar esses arranjos, redefinindo-os em novas combinações. A técnica mais utilizada consiste em abrir “janelas” dentro do quadro para nelas evocar novas imagens, de modo a tornar a tela um espaço híbrido de múltiplas imagens, múltiplas vozes e múltiplos textos.

“Um personagem” já visto num dos blocos retorna novamente em outro bloco, inserido num outro arranjo, “dialogando com novos protagonistas, como que sugerindo possibilidades ilimitadas de combinações.

O que exige, consequentemente uma leitura de tipo sinestésico, atenta, ao mesmo tempo ao que é dito, ao que é mostrado nos vários quadros simultâneos e no que é comentado atráves dos inúmeros textos que correm paralelamente sobre as imagens.

A multiplicidade práticada em trabalhos como esse nos coloca cara a cara com uma tendência da arte contemporânea caracterizada pela recusa das formas unitárias ou sistemáticas e pela aceitação deliberada da pluridimensionalidade da instabilidade e a mutabilidade como categorias produtivas no universo da cultura.

Desconstrução do Brasil

Para se avaliar corretamente a contribuição do vídeo para uma leitura crítica do Brasil seria necessário identificar a natureza do olhar diferenciado que lança sobre o país e sobre o seu povo. Em geral, as diversas gerações de videastas rejeitaram qualquer tipo de representação totalizadora, deixando patente nas obras as suas próprias dúvidas e a parcialidade de sua intervenção, em mesmo tempo que se interrogam sobre os limites de seu gesto enunciador e sobre a sua capacidade de conhecer realmente o outro. Com o vídeo, aquele que aponta suas câmeras para o outro não se encontra mais necessariamente numa posição privilegiada como produtor de sentidos, não está mais autorizado a dizer toda verdade sobre o representado, nem está apto a dar uma coerência impossível a cultura enfocada. Os próprios realizadores não se encontram mais ausentes do “texto” audiovisual, nem se escondem atrás das câmeras de modo a sugerir uma pretensa neutralidade. O que se busca é menos dizer uma verdade sobre o outro, revelá-lo,”traduzi-lo”aos nossos cânones de inteligibilidade, do que tentar construir uma ponte entre as culturas, pra que elas possam finalmente dialogar.

(O grupo não se reduz ao ponto de vista da equipe da realização, nem esta se reduz ao ponto de vista do grupo.) Uma tentativa de troca ou de diálogo, um exercício de polifonia que pemitisse a restituição da multiplicidade de vozes. O grupo tentou inscrever o seu trabalho dentro de um processo de comunicação em que aquele que representa o outro é apenas uma dentre as muitas vozes em conflito.

Quebrar qualquer relação de saber ou de autoridade que possa existir entre o realizador e o sujeito enfocado.

Em nenhum desses trabalhos se pode encontrar uma unidade temática ou uma visão sociológica coerente, de precisão científica, que permita reconstituir uma explicação do Brasil. Pelo contrario, esses trabalhos são coerentes apenas com a tendência manifestada pelas várias gerações de videastas de recusar qualquer visão sistemática do país e de seus habitantes. A experiência radical da fragmentação e do hibridismo é a resposta dessas gerações às tentativas de totalização histórica e de síntese teleológica das gerações anteriores, obcecadas pelo projeto utópico de construção de uma identidade nacional e de um projeto de pais.

Dentro e fora da TV

O vídeo independente, produzido e difundido fora dos circuitos oficiais, podia investir no aprofundamento da função cultural da televisão, avançando na experimentação das possibilidades da linguagem eletrônica, dando ressonância aos graves problemas sociais do país e buscando exprimir as inquietações mais agudas do homem do nosso tempo. Ele podia executar, portanto, uma função cultural de vanguarda, no sentido produtivo do termo: ampliar os horizontes, explorar novos caminhos, experimentar outras possibilidades de utilização, reverter a relação de autoridade entre produtor e consumidor , de modo a forçar um progresso da instituição convencional da televisão, demasiado inibida pelo peso dos interesses que são nela colocados em jogo.

Os araras é uma investigação sobre nós mesmos, sobre os motivos confessos ou inconfessados que nos induzem ao contato com o outro, na tentativa se não de colonizá-los abertamente, pelo menos de enquadrá-lo em nosso domínio, de colocá-lo ao dispor de nosso saber.

Vídeoinstalações, vídeoperformances: the making of

Mas, ao contrario de outras formas expressivas mais antigas, o vídeo apresenta-se quase sempre de forma múltipla, variável, instável, complexa, ocorrendo numa variedade infinita de manifestações.

A tela eletrônica representa agora o local de convergência de todos novos saberes e das sensibilidades emergentes que perfazem o atual panorama da visualidade. Eis porque falar de imagem e som eletrônicos significa colocar-se fora de qualquer território institucionalizado. Trata-se de enfrentar o desafio e a resistência de um objeto hibrido, e em expansão, fundamentalmente impuro, de identidades múltiplas, que tende a se dissolver camaleonicamente em outros objetos ou a incorporar seus modos de constituição.

Macro e micropolítica

Chamamos de macro e micro políticas as experiências radicais em que a mídia eletrônica foi praticada fora de sua expressão industrial hegemônica, por sujeitos sociais movidos por projetos de intervenção crítica, expressando posições alternativas às políticas dominantes, mesmo quando, no momento de sua intervenção, essas experiências são ainda pouco extensivas, comparativamente com aquelas praticadas nos setores do entretenimento de massa amparados pelo capital global. Malgrado reduzidas às escala de seus parcos recursos humanos, técnicos e financeiros, ás vezes boicotadas, ostilizadas, perseguidas, e até mesmo condenadas à clandestinidades, as práticas políticas radicais fazem explodir os bloqueios oficiais à expressão pública e dão ressonância às vozes discordantes, minoritárias, subjulgadas e portadoras de impulso de mudança. Quando vinculadas a movimentos sociais, colocam em evidência o imenso potencial estético, cognitivo, comunicativo e mobilizador dos meios eletrônicos e de expressão.

Cidades (in)visíveis

Efeitos eletrônicos de estúdio corroem as margens tomadas in loco pelas camêras, a montagem desintegra qualquer coerência possível capaz de “explicar” o evento, até mesmo os sons gravados diretamente por ocasião da festa são processados eletronicamente para que deles não reste senão pálidos festígios.
Na verdade é menos um documentário sobre uma cidade parada no tempo e suas festas folclóricas do que uma reflexão sobre a distância entre duas culturas irreconciliáveis, ou mais exatamente, uma demonstração da nossa impossibilidade de vivenciar a experiência do outro. A “leitura” se revela uma versão entre infinitas outras possíveis. Os realizadores interferem , se mostram ofensivamente como uma presença deformante: ao focalizar a cultura do outro, eles não se negam, não renunciam ao seu mundo, aos seus próprios valores e à sua cultura, nem se deixam dissolver naquela outra. Nenhuma pretensão de objetividade esconde o fato de que o sujeito da representação, ao se defrontar com a festa alheia, traz consigo o seu próprio mundo, o seu passado e as suas referências culturais, a partir das quais e com o filtro das quais ele aborda o outro. O filme é na verdade, o relato dessa distância, a tomada de conciência dela, o questionamento mesmo da inserção do analista numa realidade que não é a sua. Trata-se de um vídeo de desconstrução da ilusão documental, um vídeo em que a intervenção do sujeito enunciador se torna crítica em relação a si mesma.

Afetos e desafetos

Recuperar alguma espécie de energia primordial das artes visuais, ou restabelecer o sentido e a força das imagens, que se teriam perdido no atual oceano de imagens industriais.

The Bit Generation

A arte do vídeo está marcada, antes de mais nada por uma ruptura com os cânones pictórios do renascimento e por uma retomada do espírito demolidor das vanguardas históricas do começo do século, fazendo voltar a sua fúria desconstrutiva sobretudo contra a figura realista que o modelo fotográfico logrou perpertuar.


PIONEIROS

VIDEOARTE: UMA POÉTICA ABERTA - Walter Zanini

Desde ao menos 1959, Nam June Paik demonstrava interesse pela tecnologia da televisão enquanto recurso de produção de arte. Em 1963 utilizou 13 velhos televisores em preto-e-branco para analisar o vídeo sob efeitos de mudança de voltagem, de distorções magnéticas da imagem e do aproveitamento dos próprios defeitos da transmissão, numa exposição que atraiu discreto número de expectadores.

O campo especulativo do vídeo mistura-se à substancialidade da TV na exploração da realidade. Mas sua problemática inverte o que passou a ser necessidade de consumo do telespectador, descerra campos insuspeitados e imprevistos. Suas origens estão sensilvemente na compreensão da arte enquanto um fenômeno acoplado à existencialidade, como um processo de atividade, colocando-se na perspectiva dos meios mais válidos da comunicação do presente. Contraposta ao consagrado objeto de arte.
A videoarte pertence ao universo multimidia, ou seja, às multiplas produções de linguagem que se comportam em níveis completamente distintos daqueles que identificam a obra única, inserida nos contextos de cotação de mercado, não significando isso que um videocassete ou um livro de artista não tenham um preço. È claro que eles o têm, mas nenhum paralelo podia ser traçado aproximando a distância que separa essas duas realidades profundamente divergentes.

A desalienação do indivíduo diante das pressões que estreitam sua conciência tem constituído uma de suas intenções essenciais e, nesse sentido, a imagem eletrônica configura-se como uma contratelevisão.

A história da videoarte demonstrou o quanto a criatividade de seus autores esbarrou na indiferença e mesmo na hostilidade dos receptores. Incompreensível, aborrecível, desinteressante, inócua, eram e são adjetivos a que se acrescenta a sua subestimação motivada pelos chamados “defeitos” ou “ enganos” técnicos, que contrastam com a sofisticação da imagem da televisão de estúdio. Alguns teóricos do vídeo têm assinalado que o “aborrecimento” do vídeo não seria maior que o da TV, a cujos programas intercalados de propaganda, promoções do canal, spots etc. Todos bem ou mal se acostumaram. Falta de hábito ou de paciência em permanecer diante de um monitor que por alguns minutos nos tras mensagens inconfrontáveis com a atitude standart das emissões da TV? È bem possível. Muitas pessoas não empregam senão 10 ou 15 segundos diante de um quadro no museu, ou muitas vezes um tempo escasso na visita a uma exposição, consideram um exagero a “perda de tempo” vendo o mais simples programa de videoarte.

Uma questão frequentemente levantada é o custo relativamente alto do equipamento. Se é um fato que ele permanece fora do alcance de muitas pessoas, seu barateamento nos países de tecnologia avançada, ou que desfrutam de acesso fácil ao instrumental necessário, é um indício de que pode haver uma disseminação em escala maior. Houve precedentes com outras mídias que permitem pensar assim. Mais importante se afigura a questão da transmissão por ora bastante dificultada, contradizendo a própria natureza da mídia que deveria ir ao encontro do usuário e não a, obrigatoriamente, provocar seu deslocamento à maneira da obra tradicional.

“Exercícios gerais da criatividade”, apoiada “principalmente nos planos de trabalho de Grotowsky para o teatro”



PRIMÓRDIOS DA VIDEOARTE NO BRASIL - Fernando Cocchiarale


Entretanto, ao contrário do que seríamos levados a supor, a principal contribuição neoconcreta para arte comtemporânea brasileira não é exclusivamente formal (construção), mas metodológica: consiste na valorização do experimental (processo) em frente de quaisquer principios normativos que limitem a invenção. A originalidade deve ser creditada antes à experimentação, que lhes possibilitou transcender as questões formais do concretismo e depois do próprio neoconcretismo, do que à estreita opção pela geometria, feita, aliás, por outros setores da vanguarda brasileira sem os mesmos resultados.

A quebra das categorias convencionais que dividem as práticas artísticas em pintura, desenho, escultura e gravura, registradas na teoria do não-objeto, 1960, de Ferreira Gullar, a participação do expectador e, finalmente, a integração entre arte e vida, que, no caso, surge enquanto um transbordamento da proposta neoconcreta de integração da espacialidade da obra com o espaço real.

Hélio Oiticica, texto : Esquema Geral da Nova Objetividade
Chegada constituída de múltiplas tendências, onde a ‘falta de unidade de pensamento’ é uma caracteristica importante.

O vídeo como meio de expressão de arte.

“Tornou-se cada vez mais patente que o vídeo-como-arte não é apenas uma nova tecnologia destinada a proporcionar entretenimento visual. È um instrumento que permite a exploração de tópicos importantes da arte contemporânea” 1960, 13° Bienal – Jack Boulton.
A invenção de tecnologias da imagem começa com a fotografia. A fotografia permitia, sobretudo após a invenção e a generalização do negativo, a extensão da lógica da produção industrial, baseada, conforme Walter Benjamin, na demissão da mão (isto é, no rebaixamento, em graus diversos, da habilidade manual do processo de produção dos bens de que nos servimos) para a produção de imagens. Segundo Benjamin, a invenção das tecnologias de registros fotossensível da imagem, no século XIX, foi determinante para as transformações ocorridas no ambito da percepção e no da valorização das obras de arte. Mas isso não significou que as linguagens da fotografia e do cinema tenham, automaticamente, nascido com suas técnicas. A maior contribuição dessas primeiras técnicas de registros icônicos para as futuras linguagens em que se transformaram, depois de décadas de experimentação, é que elas permitiram incorporar o tempo ao espaço seja pela cristalização do instante, seja pelo registro do movimento. Essas técnicas nasceram, pois, para responder a demanda latente de fluxo suscitada pela dinâmica da vida na era industrial.

De longa carreira ao longo do século passado, a fotografia, o cinema, a publicidade e, posteriormente, a televisão alimentaram o imaginário mundial com icônes não derivados da observação mimética.



VIDEOARTE NO MAC - Cacilda Teixeira da Costa

Experimentação e as reflexões sobre suporte, meio e mensagem.

No Brasil, a videoarte encontrava-se em um estágio experimental, com todos os problemas, divergências e entusiasmo que esses períodos ocasionam. Tinha um sentido de negação da televisão, pois propiciava uma informação reduzida e profunda, cujo carácter reflexivo sempre foi oposto da televisão, e desafiava o mercado de arte com obras que (para desconsolo dos marchands) não constituíam objetos vendáveis, mas possíveis circuitos de informação. No MAC/USP, a compreensão de sua operacionalidade foi aprofundada e contribuiu para que uma nova geração surgisse nos anos 80, incorporando com muito pique as conquistas dos pioneiros. Afinal, como lembra Regina Silveira, “no fundo as dificuldades são as da linguagem, não as do meio”.


LINGUAGENS E MEIOS


O VÍDEO COMO PROJETO UTÓPICO DE TELEVISÃO - Ivana fechine

A rigor, os termos vídeo e televisão podem ser aplicados a uma mesma tecnologia, à exploração de um mesmo meio para produção e difusão de imagens eletrônicas. A diferença entre o vídeo e a TV está, essencialmente, na sua proposta étco-estética. O sistema de televisão por broadcast definiu, com base em interesses políticos e econômicos, um modelo de comunicação que se tornou hegemônico na exploração do suporte eletrônico. Esse modelo é orientado, de modo geral por uma hierarquia da transmissão sobre a recepção (unidirecionalidade), pelos cânones da representação ilusionistas (tv como “janela” do mundo), pela “metríca” dos intervalos comerciais(interrupções que ditam a sua síntaxe). Despontando nos EUA e na Europa Ocidental 25 anos depois do advento da televisão, o campo de produção que se convencionou chamar de “vídeo”, definiu-se justamente pela negação desse modelo. Ainda hoje o vídeo é tratado por muitos críticos e realizadores como uma espécie de contratelevisão ou , quando muito, é associado à reivenção da sua linguagem, à idéia de qualquer experimentalismo envolvendo seu aparato. Com razão. Desde sua primeira utilização, por artistas de vanguarda dos anos 60, toda uma geração de pioneiros do vídeo assumiu como proposta o desenvolvimento de novas formas artísticas com os recursos tecnico-expressivos de seu antecedente, a tv. Procurando seu lugar entre a arte e a mídia, o vídeo acabou se afirmando, desde cedo, pela sua crítica contundente aos modos de produção tanto de uma como de outra. Encarado com desconfiança pela arte e pela mídia mais conservadoras, o vídeo se valeu alternadamente, dos postulados e procedimentos de uma para levar a termo o seu projeto crítico em relação à outra.

No Brasil, a proposta estética do vídeo foi determinada em grande parte pelo acesso à tecnologia.
Com mais acesso à tecnologia e maior convívio com a televisão, surge também nos anos 80 uma nova geração preocupada em explorar o vídeo para mostrar o que a tv broadcasting poderia ser como sistema expressivo e agente de mudanças socioculturais.
Aprofundar-se nos processos de exploração de linguagem ou dos limites humanos da percepção estética.

Referências:
Jean roch e Edgar Morin (crônica de um verão, 1961)
Bernadet – o cineasta se apaga em favor da voz do outro (...), que se torna sujeito do filme. Mas o olhar continua sendo o do cineasta.
Ismael Xavier- vídeo anos 90


ARTE NAS EXTREMIDADES – Christine Mello

O vídeo é uma linguagem híbrida, sua arte situada nas extremidades de outros campos, um processo de interferência no sistema, uma fenda, desvio, ou estranhamento que impulsiona o projeto de desmaterialização nas práticas estéticas.
Capacidade do vídeo de potencializar ações e provocar o entrelaçamento de diversos códigos e processos.
Verificar como esse meio dialoga e transita indistintamente por variados processos de linguagem. Nesse universo, o vídeo, em sua essencia, é considerado uma arte não linear, um fluxo continuo de informação, é uma arte do tempo.
Um contexto em que tendem manifestações tanto de ordem contemplativa, quanto participativa e interativa. Como linguagem interdiciplinar, é capaz de expressar imagens e sons por se tratar de uma escritura do movimento e do tempo, concebida por linhas (de varredura) e pontos (os pixels), dotada de textura, densidade e volume, e possilbilitador de novas relações entre espaço e tempo na arte. Sistema híbrido, o vídeo opera tanto sob a forma analógica quanto digital, na simultaneidade do tempo real, das multiplas narrativas, espaços e pontos de vista, atuando na passagem dos ambientes imersivos e dos fluxos da artemídia. O termo artemídia é empregado neste texto no sentido que lhe atribui Arlindo Machado: “para designar formas de expressão artistica que se apropriam de recursos técnologicos das mídias e da indústria do entretenimento em geral.”
A obra passa a ser vista como comunicação de idéias e informação e o significado é determinado pelo contexto do trabalho. Uma arte livre da dependência do objeto, considerada efêmera e descontínua, que rompe com o próprio ato da contemplação e o conceito tradicional de autoria, explora a experiência vivida, a idéia do inacabamento e de ações em tempo real, e provoca a mistura entre a arte e a vida em sua elaboração.
Designa mudanças nos modos da recepção e novas possibilidades acerca do espaço/tempo em variadas áreas de expressão.

Refletir o vídeo não apenas como uma tecnologia representacional-mas também como uma linguagem que associa extratégias de simultaneidade do tempo presente-constitue um modo de investigá-lo em seus mecanismos de expansão, tanto em seu caracter processual e em suas potencialidades temporais quanto em sua caracteristicas de estar entre os diversos dispositivos e ambientes. Diz respeito ao seu caminho poético de buscar os extremos da linguagem e as fronteiras que expande entre as diversas outras áreas. Trata-se de abordar um meio instável, impermanente, transitório, que introduz a idéia de fluxo midiático no universo da arte e é capaz de dialogar hoje com a ampla gama de procedimentos criativos relacionados a cultura digital.

É a mídia videográfica que acrescenta a capacidade de registrar, transmitir e reproduzir simultânea e quase instantâneamente uma imagem em movimento.


As relações entre corpo e vídeo

Criação de um campo nas artes em que o corpo e máquina são ao mesmo tempo contexto e conteúdo, interpenetrando – se na construção de significados.

http://corpos.org

www.neotao.etc.br

Um conjunto de técnicas de construção, cuja função seria perturbar as nossas percepções rotineiras e forçar a sensibilidade a “estranhar” o arranjo simbólico que lhe é apresentado. Desse modo o discurso díficil e tortuoso, e o ponto de vista não familiar, impedem o envolvimento inocente e exigem o empenho do leitor/espectador para decodificar o “texto”.

Corpo e vídeo são tratados nesses trabalhos como práticas estéticas e politícas, como espaços/tempos da subjetividade, como campos de experiência em que se tem a oportunidade de operar alguns dos muitos transitos e cruzamentos entre o homem e a máquina.

As videoinstalações e as videoprojeções

Trata-se de uma forma de expansão do vídeo para além do objeto/monitor de tv, configurando em ambientes multissensorios e fazendo explorar a projeção de imagens.

O trabalho constituido pelas videoinstalações e projeções diz respeito a questão do rompimento da hegemonia do gesto contemplativo na arte, à inclusão de múltiplos pontos de vista e ao corpo como um todo, em estado de deslocamento, inserido no contexto de significação da obra. Compreende um momento da arte de supressão do olho como único canal de apreensão sensoria para a imagem em movimento. Nesse processo, insere-se de modo radical a idéia de desmaterialização e do ato artistico como abandono do objeto.

Breve percurso das experiências

Realizar trabalhos interdiciplinares cujo processo de elaboração é constituido pela linguagem do vídeo. “o outro começa onde nossos sentidos se encontram com o mundo”
Possuir com particularidade o fato de conceber os seus trabalhos durante um processo de criação coletivo, e não se ocupar com uma idéia de arte em seu acabamento, mas sim de inventar formas de imaterializar uma percepção de mundo e devovê-la em seu estágio de processo. Durante a construção do discurso atua em três níveis diferenciados: o primeiro diz respeito a pensar e discutir uma dada situação. Nesse momento, a escolha do grupo de pessoas com que irão interagir determina o tema do projeto e o contexto em que esse grupo se insere irá objetivar o modo de execução da proposição. A segunda etapa do processo acontece diretamente no local da ação, por intermédio de workshops e encontros entre as pessoas envolvidadas e também na forma como são feitas as negociações e redefinições dos significados entre ambas as partes. E o terceiro momento, a última fase do processo criativo tem a sua resaolução na apresentação do trabalho ao público, já inserido na composição do espaço expositivo.

Abordagens psicossubjetivas

É notável verificarmos nesse conjunto de dez videoinstalações o quanto essa rede de conexões estabelecida com o outro e o quanto movimentos opostos entre o que é real e o construção intercambiam-se gerando uma ambiguidade capaz de nos fazer entrar num jogo narrativo muito mais complexo e desconcertante sobre confrontos com a vida real e certos dilemas da sociedade contemporânea. Expandem-se, assim, as fronteiras entre o documentário e a ficção, o visível e o sugerido, o vivido e o imaginado.

O caráter documental encontrado hoje nas videoinstalações está associado à possibilidade de se conhecer e viver uma dada circunstância. Não se trata mais de referendarmos a produção do olhar nesses trabalhos, mas sim a produção da experiência. A qualidade da obra encontra-se no modo como faz o público compartilhar e viver experiência oferecida. Trata-se de trabalhos exploratórios, que requerem mais sentidos para sua compreensão. È própria ezperiência como proposição de arte. Esses trabalhos deflagram e permitem ao público viver o seu processo de criação. Idealizam muito mais sua estética em termos de obra inacabada do que acabada, pois importa menos o sentido final depositado no trabalho e mais a qualidade com que é empreendida a vicência dos sentidos no interior dele.

Nessa direção encontramos também a produção poética de Cao Guimarães. Entre seus inúmeros trabalhos destaca-se a videoinstalação Rua de Mão Dupla, apresentada em 2002 na 25° Bienal Internacional de São Paulo, sob curadoria de Agnaldo Farias. Antes de montá-la na Bienal, Cao propôs a três pares de pessoas de classes sociais e personalidades bem distintas, que não se conheciam, ttrocarem de casas simultaneamente pelo período de 24 horas, levando consigo uma câmera de vídeo para o registro de suas impressões. Durante a exposição, ele apresenta as imagens produzidas por essas seis pessoas, em três pares de monitores colocados lado a lado de forma alternada pelas parede do espaço expositivo. Em cada par de monitores há a experiência de uma pessoa na respectiva casa da outra.

A experiência para ser compreendida necessita também de ser percebida, vivenciada pelo público, que tem a possibilidade nesta sala de juntar os universos distintos e confrontar uma experiência com a outra, de forma simultânea, em tempo real, tanto quanto foi antes vivenciada por aqueles que participam da ação. A proposição dada, para ambos os casos, é decifrar uma pessoa sem ser possível conhecê-la pessoalmente. Estratégia de certa forma análoga ao ato de cegos identificarem um universo, perceberem uma vida, um lugar, e neste caso, a ação é mediada pela câmera de vídeo.

Não se trata mais apenas do exercício do ver essas imagens, mas sim experimentar também com essas outras pessoas um espaço-tempo novo proposto na totalidade dos elementos existentes na sala, que só são possiveis de serem compartilhados no modo como artista disponibiliza o trabalho, no modo como andamos pelo espaço, no modo como sem perceber trombamos com o outro - com o estrangeiro - dentro do próprio ambiente do trabalho.

O proplema maior colocado por esta videoinstalação diz respeito à constatação de que o trabalho de arte não é mais para ser apenas contemplado, mas para ser vivenciado. Saída para o espaço vivencial, o espaço da ação. Deflagrar a equação de que importa menos a obra acabada, e importa mais viver o processo. Lygia Clark ao dizer que “é no instante em que pratica o ato que o expectador percebe simultaneamente o sentido de sua própria ação”. Para ela, ao mesmo tempo em que ele (artista) se dissolve, ele permite que os outros dividam com ele o instante-já de criação do trabalho e não somente o instante-depois, do trabalho já pronto.

Oferecer a proposição e permitir que ela seja construída durante o fazer/apresentar da obra.Possibilita que o público se contagie com o outro, que não é apenas a obra acabada, o outro que esta no vídeo, mas o outro que também compartilha com ele a fruição do trabalho.

Experiência sensória e vivencial de espaço-tempo, este é o projeto conceitual que toda instalação se ocupa.

Propõe ambientes plurais, tempos simultâneos na arte, bem como a inclusão do expectador no processo de significação. Trata-se de artistas que de modo geral buscam-se expandir o vídeo à partir dos limites da tela em suas extremidades de linguagens. Apontam, em diferentes perspectivas, que o vídeo não é apenas uma questão exclusiva do olhar, mas de diversos elementos e estratégias envolvidas e do acionamento de todo aparato sensório.Ao ativarem no vídeo mecanismos de representação videograficas associados ao ambiente e a eventos simultaneos de presentificação do tempo, transportam a proposição artística para uma experiência hibrída, fazendo com que qualidades estéticas do vídeo, antes resumidas ao gesto contemplativo e aos limites da percepção visual, sejam ampliadas em questões do ambiente e em ações de cunho participativo e interativo na arte.

Novas estratégias de apresentação do vídeo

Trata-se de estrstégias a que recorrem os artistas em torno a novas modalidades de fruição e apresentação do vídeo, já que é a partir do ato presente r na ordem do acontecimento que residem suas ações. Para eles, o que está em jogo é a busca de multiplas dinâmicas de processar a arte, e de novos mecanismos de interação do expectador com a obra. Ao incluirem a participação do público como parte inerente à construção dos sentidos, a linguagem do tempo real e o tempo ao vivo em seus trabalhos, passam a se caracterizar muito mais pela idéia de uma arte do não local, não objetual, uma arte da vida, que inclue o expectador na trama de significados por ela gerados, do que uma arte relacionada a um produto especifico, ao resultado final de uma obra ou à atitude contemplativa do expectador.

Estabelecer todo um canal expresivo do vídeo como fluxo e mídia transgressora, capaz de compor ao mesmo tempo uma arte do movimento, do tempo presente e do acontecimento,

Fundir em um único trabalho ‘música, palavra, imagens de vídeo e cinema, texto literário, dança, artes plásticas, sendo que tudo ocorre frente aos olhos da pláteia com a força de um evento ao vivo.

Uma experiência estética que responde às novas necessidades de representação da contemporaneidade.

Como meio de intervir numa contemporaneidade que não se apresenta de forma linear, não permite a contemplação estática e apela a todos os sentidos. Empreender no vídeo novos caminhos para o trabalho coletivo, bem como a discussão dos designios atuais a cerca dos regime de autoria.

http://telepatia.blogspot.com

www.projetometafora.org

http://profana.com


Bem recentemente surge a blog art, espécie de narrativa não linear feita de forma colaborativa na internet, mistura de processo e produto, que muitas vezes se utiliza de arquivos de vídeo. Este é o caso do Projeto Telepatia, desenvolvido por Daniel Sêda, cuja idéia inicial prevê a realização de uma narrativa em vídeo de navegação não-linear em um aplicativo multimídia. No atual estágio ele envolve ainda um site, onde são publicados os vídeos já realizados, e um blog, onde são escritas idéias de personagens, roteiros e situações. Esse blog serve como ensaio para uma escritura não-linear, e como possível estrutura narrativa do aplicativo multimídia a ser realizado.

Hoje em dia, observamos a informação a sua rede de conexões constituírem –se contexto para as operações artísticas. O artista “se firma como provedor de conteúdo e sua ação denota uma performance coletiva, por meio da intervenção do espectador no trabalho. O artista e a obra não estão mais isolados no processo criativo, já que é na co-presença e na troca com o outro que a obra se realiza. O sistema passa a ser a construção, e a obra uma prática viva”.

São gerados, assim, pensamentos híbridos e circunstâncias diferenciadas ao processo de elaboração artística: o modo de transformação da idéia se dá por mecanismos de contaminação e hibridação entre os meios tecnológicos. Trata-se de criadores que encontram em suas poéticas o embate direto com as mídias, geram uma série de trabalhos que subvertem-alteram-ampliam o sentidoinicialmente previsto por meio eletrônico – quer seja na discussão conceitual, quer seja em torno das novas formas de expeenciação estética, conseguindo a díficil tarefa de conciliar o circuito da arte às mídias de massa.

Processos nas extremidades

As leituras estéticas ao seu respeito encontraam-se, desse modo, em movimento, em processo, nos deslocamentos e falhas, saindo da observação das especificidades exclusivas à sua linguagem e entrando na análise de suas influências no campo geral da arte.

Esses processos atuais apontam novos caminhos de complexidade, imprimem movimento e um perfil de ações reunidas em torno à arte produzida em nosso país.

Típicas da arte do vídeo, são descobertas do ver em deslocamento, de maneira imperfeita, que tendem ao incompreensível, e que podem sser compreendidas como modo de ampliar os sentidos e de conciliar o mundo contemporãneo com a estética da demolição videográfica.

Com a inclusão da artemídia no painel da arte contemporânea no Brasil são gerados pensamentos híbridos e circunstâncias diferenciadas ao processo de elaboração artística. Torna-se inevitável que o modo de transformação da idéia passe a acontecer por mecanismo de contaminação e na confluência entre as artes visuai e os meios tecnológicos.


ALARGANDO AS MARGENS – Claúdia Mesquita

Vídeo documentário, o projeto de elaborar, ‘de dentro ‘, as identidades dos sujeitos retratados, em oposição ou para além do estigma, está na linha do horizonte. Mais variam as estratégias mobilizadas para provocar e compor – na abordagem e na montagem- discursos ‘ identitários’.

Exemplo:
O documentarista chega a passar o microfone a Gilberto, um de seus personagens, num esforço evidente de alçar seu ‘objeto’ a condição de sujeito da experiência que o próprio vídeo propõe. O procedimento, além de desvelar, reflexivamente, o set da entrevista, complexifica expressivamente a representação dos moradores de rua levada a cabo pelo vídeo – confrontado com ‘iguais’ diferentes, Gilberto veste outros papéis, e todos saem ampliados dos encontros.


Não há pretensão de denúncia, de indignar o espectador pelo incômodo das imagens, tampouco provocar identificação de sujeito de ação coletivo, organizado para mudar determinado estado de coisas. Diferentemente disso, parte-se da conciência, pelos sujeitos retratados de um estigma que rejeitam, e do poder da câmera para forjar e fixar imagens e versões.
Sujeitos que não mais identificados por relações de trabalho, de certa forma buscam sua identidade.
Suas intervenções são entrecortadas e fica sempre a sensação de incompletude: o vídeo trabalha com fragmentos de singularidades, reforçando a impressão de identidade na ausência.
Como escreve Katrhryn Woodward, “embora possamos nos ver, seguindo o senso comum, como sendo “a mesma pessoa” em todos os nossos diferentes encontros e interações, não é díficil perceber que somos diferentimente posicionados, em diferentes momentos e em diferentes lugares, de acordo com os diferentes papéis sociais que estamos exercendo (...)Há diferentes identidades envolvidas em diferentes ocasiões.
O que hoje melhor caracteriza as possibilidades do filme (ou vídeo) documentário é a presença do processo de produção(...) o próprio ato de gravar e representar intervém na mudança do resultado diante de nossos olhos(...) o materialismo(...) é nesses filmes não uma função de uma verdade histórica, que pode ser colocada em oposição ao fictício(...)o processo de produção torna-se um evento em si mesmo ( Jamesom,1995 para cabra marcado para morrer)

Citações, trechos e fragmentos extraido do livro
Made in Brazil – Três décadas de vídeo brasileiro